Quem foi realmente responsavel pelo trabalho da Dolly? Esta foi a questão-tabú da entrevista que Ian Wilmut concedeu ontem em Edinburgo ao Ciência Hoje. Está a ser alvo de um processo judicial, razão pela qual Ian não se pode pronunciar enquanto o processo não estiver terminado. Mas manifestou-se contra a clonagem de seres humanos. Diz que os problemas psicológicos para os clonados seriam intoleráveis.
Ciência Hoje - Dez anos! Já passou muito tempo! O que recorda mais desse dia 5 de Julho de 1996?
Ian Wilmut - Muitas coisas aconteceram. Na verdade, não presenciei o nascimento da Dolly. Por precaução, para que a ovelha mãe não sofresse qualquer tipo de stress, decidi que apenas o pessoal directamente envolvido no parto deveria estar presente. Por motivos semelhantes também não assisti aos partos anteriores ao nascimento, com sucesso, da Dolly.
CH - Que importância atribui à primeira clonagem de um animal? Acreditou sempre que ia ser bem sucedido?
I.W. - Quando os investigadores se lançaram neste projecto, o objectivo era desenvolver um método eficiente para efectuar alterações genéticas em animais que pudessem ser utilizadas em biomedicina – para a produção, em larga escala, de fármacos, por exemplo. Não estavam cem por cento confiantes do sucesso deste empreendimento, assim como também não estavam totalmente confiantes de que o nascimento da ovelha que viria a ser a Dolly seria bem sucedido – a ovelha mãe foi, evidentemente, seguida de perto, e várias ecografias foram feitas durante o período de gestação, mas a confiança nunca foi total.
A Dolly abriu caminho ao objectivo inicial – o de criar animais transgénicos. De facto, este objectivo é hoje uma realidade: existem hoje vacas que produzem anticorpos humanos e porcos cujos corações foram geneticamente manipulados de modo que não são rejeitados quando transplantados para babuínos.
CH - Houve críticas de envelhecimento precoce: que «idade» tinha realmente a Dolly quando nasceu, isto é, que papel tem a informação genética herdada nestes casos? A situação é igual à de um animal nascido normalmente?
I.W. - A Dolly morreu de cancro do pulmão, provocado por uma infecção viral. A única outra anormalidade detectada após a sua morte foi sofrer de artrite. A questão do envelhecimento precoce não ficou resolvida por completo. De facto, a Dolly possuia telómeros encurtados (os telómeros são porções de ADN, nas extremidades dos cromossomas, que se vão encurtando à medida que um organismo envelhece – cada vez que uma célula se divide, os telómeros encurtam, nota da redacção) mas não viveu o tempo suficiente para o grupo poder estudar os efeitos desta observação. Seria necessário produzir-se um número razoável de clones, que vivessem algum tempo, para se poder saber ao certo qual o efeito dos telómeros encurtados.
CH - Que limites julga serem aceitáveis para a clonagem? A sociedade tem o direito e/ ou o dever de impor limites à investigação científica? E a clonagem deve restringir-se a fins terapêuticos?
I.W. - No que respeita à clonagem humana, deve ser proibida. Para além dos obstáculos físico e biológicos à sua realização, os problemas psicológicos que adviriam da existência de indivíduos clonados seriam intoleráveis.
Sim, a sociedade deve-se envolver neste tipo de decisões. Sou de opinião que o sistema britânico, de criação de comissões ad hoc, constituídas por especialistas de várias áreas e cidadãos, é um bom sistema. Veja-se o trabalho da Comissão Warnock, sobre as implicações éticas, sociais e legais dos desenvolvimentos em reprodução medicamente assistida, nos anos 80.
Parece-me um erro impor limites à investigação/pesquisa, pelos efeitos que pode ter sobre a aquisição de novos conhecimentos. A fase mais apropriada para estabelecer limites será a que se segue à investigação, ou seja, a aplicação desses conhecimentos. Ora, tais limites já existem, nos países chamados desenvolvidos.
Preocupa-me mais que as pessoas repudiem (ou se afastem) do conhecimento do que este seja incorrectamente utilizado. Os limites devem ser colocados na forma como o conhecimento é utilizado, e não na sua produção.
CiênciaHoje - Nov 2009
Ciência Hoje - Dez anos! Já passou muito tempo! O que recorda mais desse dia 5 de Julho de 1996?
Ian Wilmut - Muitas coisas aconteceram. Na verdade, não presenciei o nascimento da Dolly. Por precaução, para que a ovelha mãe não sofresse qualquer tipo de stress, decidi que apenas o pessoal directamente envolvido no parto deveria estar presente. Por motivos semelhantes também não assisti aos partos anteriores ao nascimento, com sucesso, da Dolly.
CH - Que importância atribui à primeira clonagem de um animal? Acreditou sempre que ia ser bem sucedido?
I.W. - Quando os investigadores se lançaram neste projecto, o objectivo era desenvolver um método eficiente para efectuar alterações genéticas em animais que pudessem ser utilizadas em biomedicina – para a produção, em larga escala, de fármacos, por exemplo. Não estavam cem por cento confiantes do sucesso deste empreendimento, assim como também não estavam totalmente confiantes de que o nascimento da ovelha que viria a ser a Dolly seria bem sucedido – a ovelha mãe foi, evidentemente, seguida de perto, e várias ecografias foram feitas durante o período de gestação, mas a confiança nunca foi total.
A Dolly abriu caminho ao objectivo inicial – o de criar animais transgénicos. De facto, este objectivo é hoje uma realidade: existem hoje vacas que produzem anticorpos humanos e porcos cujos corações foram geneticamente manipulados de modo que não são rejeitados quando transplantados para babuínos.
CH - Houve críticas de envelhecimento precoce: que «idade» tinha realmente a Dolly quando nasceu, isto é, que papel tem a informação genética herdada nestes casos? A situação é igual à de um animal nascido normalmente?
I.W. - A Dolly morreu de cancro do pulmão, provocado por uma infecção viral. A única outra anormalidade detectada após a sua morte foi sofrer de artrite. A questão do envelhecimento precoce não ficou resolvida por completo. De facto, a Dolly possuia telómeros encurtados (os telómeros são porções de ADN, nas extremidades dos cromossomas, que se vão encurtando à medida que um organismo envelhece – cada vez que uma célula se divide, os telómeros encurtam, nota da redacção) mas não viveu o tempo suficiente para o grupo poder estudar os efeitos desta observação. Seria necessário produzir-se um número razoável de clones, que vivessem algum tempo, para se poder saber ao certo qual o efeito dos telómeros encurtados.
CH - Que limites julga serem aceitáveis para a clonagem? A sociedade tem o direito e/ ou o dever de impor limites à investigação científica? E a clonagem deve restringir-se a fins terapêuticos?
I.W. - No que respeita à clonagem humana, deve ser proibida. Para além dos obstáculos físico e biológicos à sua realização, os problemas psicológicos que adviriam da existência de indivíduos clonados seriam intoleráveis.
Sim, a sociedade deve-se envolver neste tipo de decisões. Sou de opinião que o sistema britânico, de criação de comissões ad hoc, constituídas por especialistas de várias áreas e cidadãos, é um bom sistema. Veja-se o trabalho da Comissão Warnock, sobre as implicações éticas, sociais e legais dos desenvolvimentos em reprodução medicamente assistida, nos anos 80.
Parece-me um erro impor limites à investigação/pesquisa, pelos efeitos que pode ter sobre a aquisição de novos conhecimentos. A fase mais apropriada para estabelecer limites será a que se segue à investigação, ou seja, a aplicação desses conhecimentos. Ora, tais limites já existem, nos países chamados desenvolvidos.
Preocupa-me mais que as pessoas repudiem (ou se afastem) do conhecimento do que este seja incorrectamente utilizado. Os limites devem ser colocados na forma como o conhecimento é utilizado, e não na sua produção.
CiênciaHoje - Nov 2009
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