02 janeiro 2010

Teoria endossimbiótica - A origem da célula eucariota

A maioria dos biólogos considera que a divisão fundamental no mundo biológico é a que separa os seres procariontes dos eucariontes, divisão esta, baseada na estrutura celular dos organismos. No entanto, apesar das diferenças bem conhecidas entre estes dois grupos, têm sido estabelecidas importantes relações entre eles.
Os procariontes constituem, mesmo na actualidade, mais de metade da biomassa da Terra, e colonizaram todos os ambientes. No entanto, a evolução não se satisfez com este sucesso e surgiram níveis mais complexos de organização.
A origem da Vida parece ter ocorrido há cerca de 3400 M.a., quando o nosso planeta já teria 1000 ou 1500 M.a. de idade. A célula conserva em si, a nível da sequência de aminoácidos, proteínas ou bases nucleotídicas, diversas marcas do seu passado, pois cada gene de uma célula actual é uma cópia de um gene muito antigo, ainda que com alterações.
Este é o motivo porque se considera a existência de um ancestral comum entre organismos que apresentem grande número de nucleótidos ou proteínas comuns.
Até há pouco tempo considerava-se que as células eucarióticas teriam derivado de procariontes unicelulares, por um processo desconhecido de complexificação, designado por hipótese autogénica. Esta teoria considera que a célula eucariótica teria surgido através de especialização de membranas internas, derivadas de invaginações da membrana plasmática.
É sabido que a associação entre duas células é comum e pode trazer vantagens importantes, tanto em procariontes como em eucariontes. As bactérias formam frequentemente agregados simples, em que as células não apresentam ligações citoplasmáticas, mas beneficiam, apesar disso, da protecção do número. O estudo de situações deste tipo revelou, no entanto, que um conjunto de procariontes nunca funcionará como uma estrutura multicelular.
Surge, portanto, um corolário para esta afirmação, que consiste na obrigatoriedade da presença de células eucarióticas para o desenvolvimento da multicelularidade.

A teoria de maior aceitação, proposta por Lynn Margulis, a Teoria Endossimbiótica, sugere que as células eucarióticas seriam o resultado da associação de células procarióticas simbióticas.

A simbiose entre estas células procarióticas teria evoluído para graus de intimidade tais, que algumas células envolveriam outras completamente, embora as primeiras ficassem intactas no interior do hospedeiro. Estas células envolvidas teriam originado os organitos de uma célula eucariótica actual.
Segundo Margulis, a célula eucariótica típica teria surgido sequencialmente, em 3 etapas, como se pode ver ao lado:
proto-eucarionte tornou-se hospedeiro de bactérias aeróbias, obtendo mitocôndrias;
proto-eucarionte tornou-se hospedeiro de bactérias espiroquetas, obtendo cílios, flagelos e, mais tarde, outras estruturas com base em microtúbulos como os centríolos e citosqueleto;
proto-eucarionte tornou-se hospedeiro de cianobactérias obtendo plastos.
Um bom exemplo de como esta teoria pode ser correcta é a evolução dos cloroplastos em protistas fotossintéticos, que parece resultar de uma série de processos endossimbióticos.
Aparentemente todos os cloroplastos remontam ao envolvimento de uma cianobactéria ancestral por uma outra célula, um proto-eucarionte. Este será designado o fenómeno endossimbiótico primário e teria resultado na formação do cloroplasto clássico com duas membranas (uma resultante da membrana plasmática da cianobactéria e outra da membrana da vesícula de endocitose da célula maior). Teria sido assim que surgiram os cloroplastos das algas verdes e vermelhas.
As algas euglenófitas, no entanto, teriam cloroplastos formados por um fenómeno endossimbiótico secundário, ou seja, o seu ancestral terá envolvido uma clorófita unicelular e descartado toda a célula excepto o cloroplasto. Esta é uma possível explicação para o facto de as euglenófitas apresentarem os mesmos pigmentos fotossintéticos que as clorófitas e as plantas, bem como para a terceira membrana que envolve o cloroplasto destas algas unicelulares.
Outros protistas fotossintéticos apresentam cloroplastos resultantes da endossimbiose secundária de rodófitas unicelulares e chegam mesmo a participar em fenómenos de endossimbiose terciária, originando um grupo de dinoflagelados com cloroplastos envolvidos por quatro membranas.
Alguns outros factos parecem apoiar a teoria endossimbiótica:
- material genético igual entre procariontes e eucariontes;
- transcrição e tradução semelhantes;
- simbiose é um processo muito comum no mundo vivo;
- tamanho de cloroplastos e mitocôndrias muito semelhante ao dos procariontes actuais;
- membrana interna dos cloroplastos e mitocôndrias é produzida pelos próprios organitos;
- ribossomas dos cloroplastos semelhantes em tamanho e características aos dos procariontes ;
- síntese proteica das mitocôndrias e cloroplastos é inibida por substâncias inibidoras de procariontes (estreptomicina e cloranfenicol) mas não por inibidores de eucariontes (ciclo-heximida);
- aminoácido iniciador da cadeia polipeptídica de uma mitocôndria ou cloroplasto é a formil-metionina, como nas bactérias, e não a metionina, como nos eucariontes (e arqueobactérias);
- DNA próprio nas mitocôndrias e cloroplastos, semelhante, em estrutura, ao material genético bacteriano, não associado a histonas;
- divisão autónoma das mitocôndrias e dos cloroplastos;
- protozoários que vivem em simbiose com bactérias não têm mitocôndrias mas realizam respiração aeróbia por intermédio das bactérias, localizadas no interior de vacúolos.
No entanto, muitas dúvidas persistem, pois a transferência lateral de genes complica grandemente o estudo das linhagens celulares mas, ao mesmo tempo, não parece ter sido suficiente para explicar o facto de cada vez mais genes com origem bacteriana serem encontrados em eucariontes.
Uma origem endossimbiótica de mitocôndrias e cloroplastos permite explicar a presença de genes bacterianos que codificam enzimas do metabolismo energético mas não explica a presença de muitos outros. O genoma eucarionte é claramente uma mistura com dupla origem.
Um sugestão recente propõe que o domínio Eukarya tenha surgido através de uma fusão mutualista (e não uma endossimbiose) de uma bactéria Gram – e de uma arqueobactéria, mas ainda precisa de mais provas.
Simbiotica

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