A nova datação foi feita por uma equipa de investigadores liderada pelo arqueólogo e investigador português João Zilhão, da Universidade britânica de Bristol, com base em achados do lugar de Pego do Diabo, em Loures, perto de Lisboa.
A novidade, que é publicada hoje na revista científica PloS ONE, clarifica de uma vez por todas uma questão que estava em aberto - a da altura em que os neandertais deixaram de existir - e traz uma nova luz à compreensão das características morfológicas mistas (de neandertal e homem moderno) apresentadas pelo menino do Lapedo, descoberto há uma década no Lagar Velho, perto de Leiria.
Já se sabia que foi aqui, na Península Ibérica, a sul da fronteira natural traçada pelo vale do Ebro, que persistiram os últimos neandertais. A tese foi aliás proposta pelo próprio arqueólogo português há cerca de 20 anos e desde então aceite pela comunidade científica. Até agora, no entanto, não se sabia exactamente até quando duraram aqueles últimos resistentes nestas paragens.
A datação por radiocarbono de restos de fauna e de dentes que foram encontrados no Pego do Diabo, realizada por investigadores da Universidade de Viena, em colaboração com a equipa de João Zilhão, permitiram concluir que a data-limite para a persistência dos neandertais não pode ter sido mais recente do que 37 mil anos.
"Desde que se tornou claro, há cerca de 20 anos, a persistência tardia [dos neandertais a sul dos Pirenéus], a opinião da generalidade dos investigadores era que essa persistência não teria ultrapassado um intervalo de tempo impreciso, entre 34 mil e 38 mil antes do presente", adiantou ao DN o arqueólogo português. "Os novos resultados vêm, por um lado, trazer maior precisão a estas estimativas, colocando o limite em cerca de 37 mil, e, por outro, demonstrar de forma concludente o carácter infundado das especulações à volta de uma possível sobrevivência dos neandertais em Gibraltar até há cerca de 24 mil ou 28 mil anos", adiantou ainda João Zilhão. Esta descoberta vem contribuir também para compreender melhor a criança do Lapedo, da qual o arqueólogo português foi também um dos descobridores, em 1998.
Criança do Lapedo - reconstrução crânio-facial
O estudo do esqueleto e dentes da criança, que tinha cinco anos na altura da sua morte, ocorrida há 30 mil anos, revelou que o menino tinha características do homem moderno, mas também de neandertal, o que abalou o mundo da arqueologia e tem, desde então, sido motivo de debate por parte da comunidade científica.
Nunca antes do achado do menino do Lapedo tinha sido encontrada uma prova material de miscenização entre homens modernos e neandertais. Para João Zilhão, ao confirmar-se agora que deixaram de existir neandertais há 37 mil anos, "confirma-se também que o mosaico de características neandertais e modernas que caracteriza a criança do Lapedo, que data de há 30 mil anos, não pode ser interpretado como resultado de um evento de hibridação anedótico entre progenitores de espécies distintas (um neandertal, o outro moderno)". Como sublinhou ao DN, essa mistura de características "reflecte, assim, necessariamente um processo de miscigenação extensiva dos dois tipos de populações à época do contacto".
A permanência tardia dos neandertais nesta região deverá ter estado relacionada com factores climáticos.
2 comentários:
A respeito do discorrido no artigo, afirmando que houve então miscigenação extensiva, fico a pensar então que, então, há guardada, dentro do homem moderno europeu, uma herança genética Neanderthal! Achei estranho, pois, li em outros artigos que não se descobriu qualquer herança desse tipo em qualquer grupo humano europeu, que em nada difere dos demais grupos de Homo Sapiens Sapiens do restante do planeta.
Dezesseis por cento dos europeus modernos possuem carga genética dos Neanderthais e cinquenta por cento dos sul asiáticos.
Enviar um comentário